Ensaio 14

Curadoria: Eduardo Picanço Cruz :. D.Sc.

O trabalho e o empreendedorismo feminino brasileiro no exterior: entre barreiras e oportunidades

Niterói, 24 de abril de 2023

Autor: Roberto Pessoa de Queiroz Falcão, D.Sc.

Prof. do PPGA da UNIGRANRIO

Nos últimos anos, temos visto uma crescente migração brasileira com destino aos países mais desenvolvidos do mundo, mais notadamente para América do Norte e Europa. Antigamente o mais comum era vermos sobretudo os homens migrando em busca de condições melhores de trabalho, e sustentando as famílias de longe (e enviando remessas mensalmente). Mas parece que essa tendência tem mudado, como apontam os dados do World Migration Report (2020) que mostram que 48% de todos os migrantes internacionais eram do sexo feminino, resultando em mais de 130 milhões de mulheres migrantes.

No caso das mulheres que emigram do Brasil, temos visto em nossas pesquisas, que em alguns países receptores, como Alemanha, Suíça, e países Nórdicos, há uma tendência à chamada feminização dessa migração, ou seja, mais mulheres migrando do que homens.  Vimos também que são mulheres, em sua maioria, com nível superior que buscam melhores condições de vida para si e para sua família, como uma educação melhor, segurança e estabilidade econômica. Descobrimos também em nossas pesquisas que acontece muito a migração matrimonial, ou seja, quando mulheres acabam indo morar no exterior por casamento com nativos ou mesmo para acompanhar seu cônjuge brasileiro, que teve uma oportunidade de trabalho no exterior.

Em um outro extremo, há também as brasileiras que trabalham por conta própria no exterior exercendo trabalhos menos valorizados, como as que tentam a sorte como babás, au pair ou empregadas domésticas, que entram muitas vezes com visto de turista, permanecendo por anos até poderem regularizar o seu estado e, recorrendo ao casamento, em alguns casos, para regularizar seu status migratório.

Sabemos também que o Brasil, por si só possui uma imagem internacional, um estereótipo da mulher bonita e sensual, que influencia a visão masculina dos estrangeiros. As brasileiras, muitas vezes conhecem estrangeiros durante suas férias ou na ocasião de viagens de negócios ao Brasil. Pode ocorrer também, que é o caso de muitas brasileiras que conheci morando na Europa, de terem conhecido seus maridos ao estudarem no exterior.

Outro ponto que deve ser levado em consideração na adaptação de brasileiras ao exterior são as diferenças culturais e climáticas, que incluem dias frios e escuros no inverno do norte da Europa, ou a dificuldade de se aprender uma língua como o norueguês ou o alemão. Há também as barreiras à validação de um diploma e a consequente dificuldade de sua reinserção no mercado de trabalho no exterior, o que ocorre mais no caso das que vão acompanhadas de seus maridos do Brasil ou as que não estão indo para o exterior por motivos de estudo.

Essas barreiras geram desafios particulares. Muitas vezes as imigrantes têm que se reinventar e estudar para exercerem uma nova profissão ou ingressarem em uma nova carreira (como estética, enfermagem, ou trabalhar no setor de turismo). Em alguns casos, as barreiras podem também gerar uma motivação para criar seus negócios, em busca de maior autonomia financeira e de uma vontade de se sentir útil, quando os filhos já estão na escola matriculados. Muitas das vezes esses negócios estão ligados à culinária (negócios caseiros de brigadeiros, bolos de aniversário, marmitas) ou de estética (depilação, cabelereiras, manicure).

Quando a comunidade brasileira e latina em um país é grande o suficiente, pode ocorrer uma opção por atender a esse nicho de mercado, vendendo produtos e serviços para sua comunidade étnica. Isso ocorre também muitas vezes devido ao baixo conhecimento linguístico em uma segunda ou terceira língua, o que é um agravante quando pensam em trabalhar ou mesmo empreender em países que não têm o inglês como língua materna. Daí também a escolha do nicho étnico, onde elas podem se sentir mais confortáveis para atender a seus clientes.

Já diante daquele estereótipo idealizado pelos europeus da beleza feminina brasileira, essas mulheres buscam se reinterpretar e mobilizar essa imagem (por vezes negativa), transformando-a em um valor agregado associado a uma cultura corporal ‘estética’ brasileira, para estabelecer seus negócios nesse setor e vender serviços de estética, depilação, biquinis, lingeries, cosméticos, dentre outros produtos. Neste caso, a estética corporal torna-se um trunfo empresarial, uma espécie de “capital estético-corporal” que se soma ao capital social e humano.

No caso dos negócios de comida, há também a curiosidade de se conhecer uma culinária exótica e tropical – a brasileira, que gera também o sucesso de alguns empreendimentos de comidas típicas adaptadas ao sabor e hábitos locais – o pão de queijo em substituição ao muffin, o brigadeiro em substituição ao chocolate, a feijoada em substituição ao cassoulet, o açaí em substituição ao sorvete ou smoothie. Nessa linha entram também as mulheres que trabalham como professoras de dança, ou que são cantoras de música brasileira (sobretudo de MPB e bossa nova). Mulheres, saibam que vocês não estão sozinhas! Há muitos grupos de acolhimento nos países que são destinos de imigração, há organizações de mulheres empreendedoras, há os grupos de Facebook com dicas valiosas, além de algumas associações de mulheres imigrantes. Aonde quer que vocês estejam procurem esses grupos de apoio.

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