O crescimento orgânico dos negócios de imigrantes
Niterói, 25 de fevereiro de 2021
Eduardo Picanço Cruz :. D.Sc.
Sou professor de finanças há mais de 20 anos, mas desde 2012 que aceitei o desafio de migrar do mundo (e dos livros) das grandes empresas – área de administração – para o ecossistema das micro, pequenas e médias empresas (MPMs) – área de empreendedorismo.
Afirmo, sem medo de errar, que tem sido um processo de reaprender o mundo das finanças, a partir das questões que envolvem esse tipo de empresa.
Sempre comentava que o ambiente competitivo das micro, pequenas e médias empresas (MPMs) era muito mais inóspito do que o das grandes empresas. Afinal, vamos pensar:
– quantos concorrentes a Coca-Cola teve ao longo de sua jornada de gigante dos refrigerantes? Pegue o mercado brasileiro para ficar fácil, talvez a gente consiga contar nos dedos das mãos;
– quantos concorrentes a pizzaria da sua esquina tece ao longo de sua existência? Cada dia uma novidade, cada dia um novo aplicativo, um novo tipo de comida, uma moda, etc.
Sou profundo defensor da percepção de que o planejamento estratégico das grandes empresas é muito mais tranquilo do que o das MPMs, simplesmente porque a quantidade de possibilidades de desestabilização do cenário dos negócios das grandes empresas é muito menor do que o das MPMs.
A rotatividade de pessoal nas MPMs também é maior, afinal, todos os bons funcionários têm o direito de serem descobertos nessas empresas e serem contratados para grandes empresas – com mais estabilidade.
Ora, se precisamos adaptar os conhecimentos de estratégia, marketing, gestão de pessoas, entre outras áreas, por que isso não seria diferente para a área de finanças.
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Em uma grande empresa o gestor financeiro tem muitas atribuições, afinal todas as demais áreas da empresas precisam de dinheiro para execução de suas tarefas. Mas um gestor financeiro de uma MPM simplesmente não pára.
Normalmente, um empreendedor começa sendo um gerente geral, ou seja, ele é o responsável pela produção, marketing, logística, administração e finanças. Na medida em que o negócio vai crescendo, e prosperando, é muito comum que o empreendedor contrate colaboradores para ajudá-lo em todas as diferentes áreas. Mas ele nunca deve abandonar a gestão financeira. Ele vai dormir pensando no que tem a pagar, a receber, nos projetos de expansão, nos medos do futuro, etc.
Mas uma das grandes atribuições do gestor financeiro é a avaliação de investimentos.
Em uma grande empresa, ensinamos nossos alunos a elaborarem fluxos de caixa de projetos, calcularem a taxa interna de retorno, o período de payback e o valor presente líquido e comparamos com o custo médio ponderado de capital (se o investidor for a empresa) ou com o custo de oportunidade (se o investidor for uma pessoa física).
Fazemos isso porque estamos estudando uma relação de CUSTO x BENEFÍCIO. Porém, nesse caso, o custo é principalmente executado no início do projeto (chamamos ele de INVESTIMENTO INICIAL) e o benefício esperado se dará no futuro (chamamos ele de PROJEÇÃO DO LUCRO).
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Se tentarmos trazer essa análise, friamente, para o ambiente das MPMs vamos ignorar o fato de que alguns negócios – principalmente as microempresas – começarem simplesmente com a impressão de um milheiro de cartões de visita. Outras vezes, começa apenas com uma página da internet.
Diversos empresários brasileiros no exterior iniciaram seus negócios quase sem querer. Começaram tirando fotos de amigos, resolvendo problemas burocráticos de colegas, vendendo comida para vizinhos, etc. Nesse caso, não há por que se falar em rentabilidade do investimento, afinal, o investimento inicial foi muito pequeno:
Vamos supor: gastamos R$150 para imprimir 500 cartões de visita para nossa nova atuação como coaching. Saindo da gráfica, encontramos uma pessoa precisando de ajuda e que aceita nosso serviço. Se cobrarmos R$150 pelo atendimento, vamos dizer que nosso payback foi de 1 dia – e o que isso quer dizer? ABSOLUTAMENTE NADA!
Esses negócios devem ter outra abordagem no que diz respeito à análise de investimento. Esses empresários devem se preocupar mais com a projeção do caixa do que com a projeção do lucro ou da taxa de rentabilidade.
Ainda temos que pensar o seguinte: o candidato a empreendedor tem um segundo emprego durante o início desse negócio?
– se sim, o fluxo de caixa desse novo negócio será um algo mais nas suas finanças pessoais – podendo ser até considerado um passatempo;
– se não, antes de pensar se vale a pena ou não iniciar o projeto, é preciso fazer cálculos para ver se vai conseguir pagar as contas do próprio negócio e ainda sobrar para pagar as contas do empreendedor.
De qualquer maneira é preciso entender que, no mundo dos MPM negócios de imigrantes é importante pensar em começar com um investimento baixo. Está pensando em vender brigadeiro no exterior? Comece fazendo em casa e vendendo para conhecidos – não há necessidade de alugar uma loja em um shopping e decorar para iniciar a venda.
O crescimento deve ser orgânico, ou seja, na medida em que aumentam os pedidos aumentamos os investimentos. Compramos um fogão industrial, reformamos nossa garagem, compramos um freezer, maior, etc. Claro! Sem esquecer a legislação local sobre o assunto. Isso significa, mais uma vez, que a gestão do fluxo de caixa é a tarefa mais importante para o gestor financeiro.
Tente estruturar seu planejamento da seguinte maneira:
O total de receita prevista (preço de vendas X quantidade vendida) deve pagar:
1. Os custos de produção (incluindo salários de possíveis funcionários)
2. As despesas de administração e propaganda (incluindo salários de possíveis funcionários)
3. O ‘salário’ do empreendedor (que deve ser suficiente para pagar as suas contas pessoais)
Mas temos algumas considerações finais:
1. Se o empreendedor tiver um outro emprego ele pode, e deve, reduzir esse ‘salário’ que vai retirar do seu novo negócio. Isso porque …
2. Sugerimos que você reserve um dinheiro para essa expansão futura. Para a compra dos equipamentos que você já está reparando que vai precisar.
Essa é uma proposta de crescimento orgânico.
Se você não comprometer muitos recursos previamente, o seu negócio certamente estará correndo menos risco. Já explicamos, no Ensaio 3, que existem dois tipos de risco: o risco de perder tempo e o risco de perder dinheiro.
Se o crescimento orgânico minimiza o risco de perder dinheiro, resta-nos o tempo. Por isso destacamos que nos casos onde o empreendedor tem um outro emprego e trabalha em seu negócio nas horas vagas – ele só está comprometendo seu tempo de descanso. Assim, se o negócio for também um passatempo esse comprometimento extra de tempo pode ainda ser relaxante. Por exemplo, tenho um ex-aluno que tem um emprego e é DJ nas ‘horas vagas’.
A questão do risco de tempo se dá na medida em que o empreendedor compromete algum tempo em que poderia estar buscando um emprego para trabalhar em seu negócio – mas nesse caso, ‘cá entre nós’, não sei se realmente ele estaria perdendo tempo.