Riscos de negócios e o Empreendedorismo de imigrantes
Niterói, 14 de dezembro de 2020
Eduardo Picanço Cruz :. D.Sc.
Vamos imaginar que em um lugar muito afastado viva uma população isolada da sociedade. Pense que as famílias estejam organizadas tal qual nós conhecemos e que cada unidade familiar produza os alimentos necessários para sua sobrevivência. Em determinado momento a aldeia resolve fazer uma grande festa de confraternização. Comemorando o que? Isso não importa, a questão fundamental é pensar que cada um vai levar para o evento uma contribuição (comida) para que seja repartida com todos.
Certamente que as famílias buscam oferecer o que eles fazem de melhor, seja bolo, pão, sucos diversos, etc. Mesmo em uma sociedade apartada do mundo, quando uma pessoa experimenta e gosta de um produto feito por outro, gera uma manifestação crucial para a existência de qualquer negócio: A DEMANDA!
A demanda por um produto (ou serviço) que você não é capaz de produzir, ou não faz por que não quer, constitui a pedra fundamental das organizações empresariais. Nenhum empresário abre um negócio para vender o que ninguém quer.
Claro que, além da demanda, outras perguntas vão permear a mente de uma pessoa que pretende montar um negócio, entre elas: a quantidade de pessoas que demanda o bem ou o serviço é grande? Posso cobrar um preço que atenda as minhas expectativas bem como seja atraente para o comprador?
O termo empreendedor, “entrepreneur”, tem origem francesa e refere-se ao sujeito que assume risco e começa algo novo. Assim, perceber demandas e tentar atendê-las é a essência da atividade empreendedora. Mas nem tudo são flores e sonhos, como infelizmente sugerem alguns livros sobre o tema. Muitos dos negócios que são iniciados pelo mundo afora fracassam. Por isso, hoje vamos falar sobre o RISCO.
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Os estudos na área de finanças nos ajudaram a compreender o risco por duas vertentes: o risco diversificável e o não diversificável. Não vamos entrar em teorias e explicações relacionadas a cada um desses tipos de risco, vamos simplificar:
– Risco não diversificável, também é conhecido como risco sistemático ou sistêmico. É o risco que todos os empresários do mesmo ramo de negócios sofrem JUNTOS. Claro, dependendo das particularidades do negócio sofrem mais ou menos, mas todos o sentem na mesma direção (para o bem ou para o mal). Por exemplo, O período de festas de fim de ano aumenta as vendas das lojas de roupas e presentes, mas não tem influência na quantidade de apartamentos vendidos por uma corretora. Como dissemos, algumas lojas vendem mais do que as outras, mas todas juntas experimentam um aumento nas vendas. O inverso também é verdade, lojas de cidades de veraneio sentem muito a diminuição das vendas no inverno – JUNTAS.
– Risco diversificável, por outro lado, é o risco inerente ao próprio negócio – SÓ SEU. Tem a ver com as SUAS escolhas. O ponto de vendas, o tratamento com os clientes, as relações com fornecedores, etc. Quanto menos preparado você for para gerir seu negócio, quanto menos conhecimento do mercado (experiência) você tiver, mas risco VOCÊ corre.
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Mapear todos esses riscos é uma tarefa fundamental ao empreendedor imigrante. Empresários brasileiros na Flórida já sabem que a melhor temporada para as vendas é entre final de novembro e metade de março, quando diversos americanos (principalmente aposentados) saem dos Estados gelados do norte e freqüentam suas casas de veraneio em Miami, Fort Lauderdale e Boca Raton (por exemplo). Por isso, é prudente preparar seus estoques ou começar os contatos para contratação de empregados temporários já em outubro (até antes, às vezes).
Mas nem todos terão o mesmo aumento de vendas. As estratégias do composto de marketing (Preço, Praça, Produto e Promoção – Segmentação) devem ser bem trabalhadas para que possam:
– preço: oferecer o produto por um valor atrativo para o consumidor – similar ou inferior ao da concorrência. Que seja dentro de uma margem de lucro razoável e que reflita os benefícios esperados (preço com base no valor de mercado);
– praça: estar em locais de boa visibilidade e passagem de clientes. Que seja de fácil acesso e tenha outros atrativos próximos (restaurantes, cinemas, etc)
– produto: esteja na embalagem certa (bonita e prática). Que tenham a qualidade esperada, o sabor agradável (no caso de comida). Se for um serviço, que seja bem prestado, no tempo combinado e com cortesia;
– promoção: que o nome da sua loja seja conhecido, que seu produto esteja ‘na boca do cliente’, que saibam os benefícios que ele oferece;
– segmentação: escolha correta do público alvo e alinhamento das 4 estratégia anteriores com as necessidades e características desse público.
Mesmo sabendo que a cidade do Porto (Portugal) seja bastante afetada pelo turismo, vimos empresas de imigrantes brasileiros que, por ter adequado corretamente sua estratégia do composto de marketing, não dependiam apenas da temporada para vender bem. Por exemplo, o fato de ter muito brasileiros por lá gera uma demanda por ‘produtos da terrinha’. Isso significa que vender para os brasileiros no Porto tem demanda o ano todo e não apenas só durante os meses de férias.
Dica para diminuir o risco
O risco se materializa em duas formas: perder dinheiro e perder tempo.
1- reduzindo o risco monetário: sugere-se ao empresário imigrante que gaste o menos possível para começar seu negócio. Isso significa tentar iniciar seu negócio através de formas informais ao invés das formais. Por exemplo, ao invés de abrir uma loja de roupa, comprar mercadoria e vender ‘porta-a-porta’, vender em empresas e escritórios, na casa do cliente, etc. O invés de abrir um salão de beleza, você pode começar a fazer unha no condomínio, na vizinhança, de casa em casa. Isso significa que se algo der errado, você pode retirar-se do negócio rapidamente sem perder muito. Mas cuidado, ser informal não é o mesmo que ser ilegal. Busque informações de como executar seu serviço ou vender seu produto de forma correta. Aqui no Brasil temos o MEI (Micro Empreendedor Individual), veja qual o enquadramento você pode usar para trabalhar de forma certa. Dessa forma, deixe para alugar a loja ou o escritório quando já tiver uma carteira de clientes que justifiquem esses gastos.
2- reduzindo o risco de tempo: nos foi relatado, ao longo dos anos de entrevistas com empresários brasileiros no exterior, que a jornada dupla é uma realidade no inicio dos negócios. Isso significa que a maioria não quer correr o risco de ‘apostar tudo’ no novo negócio enquanto não perceber que realmente vale a pela. Assim, equilibram seus empregos (formais ou informais) com os negócios próprios nos horários de folga. Não saia do emprego as pressas para abrir seu negócio, tente conciliar até o memento que seu novo negócio exija sua presença o tempo todo.
Considerações
Todos os negócios têm risco. O risco é compensado pelo lucro, o que significa que só teremos produtos brasileiros oferecidos à comunidade migrante no exterior se houver uma possibilidade de ganhar dinheiro com isso.
Se a comunidade for pequena, e os moradores locais não demandarem produtos brasileiros, não teremos guaraná, tapioca e açaí. É muito arriscado importar esses produtos, abrir uma loja e começar a vender. Assim, as estratégias do composto de marketing devem orientar os novos empreendedores a pensarem se vale a pena ou não fazer esse investimento.
Tente reduzir seus riscos entendendo suas dimensões (diferenciado e não diferenciado). Assim, medite sobre o ambiente de negócios no país onde está e opte por um negócio menos suscetível a esses riscos. Por exemplo, está morando em Orlando (Florida) aproveite que lá tem turismo o ano todo e tente abrir um negócio nesse ramo. Porém, se quiser voltar seu negócio para os turistas brasileiros, reforce-se nos meses de janeiro e julho.
Outra forma de reduzir o risco é conhecer como ele se materializa (tempo e dinheiro). As estratégias sobre como lidar com esses riscos são investir pouco e a dupla jornada de trabalho.